quinta-feira, 1 de fevereiro de 2018




01 DE FEVEREIRO DE 2018
DAVID COIMBRA

Um e-mail de um amigo distante

Recebi um e-mail do Dadinho. Na verdade, um e-mail da filha do Dadinho, escrito por ele. O Dadinho não haverá de ter e-mail. Certos homens são indiferentes ao mundo virtual, interessa-lhes apenas a concretude da vida. O Dadinho é um desses. Seu bom coração não combina com o fel que destilam as redes.

O Dadinho era meu amigo de Cachoeira do Sul e... Agora, só de escrever esse tempo verbal, estremeci. Como assim, "era"? O Dadinho continua vivo, tanto que me enviou e-mail, e foi um e-mail amistoso. Quer dizer: não há nada que indique que não somos mais amigos.

Mas falei dele no passado.

Porque deve fazer mais de 10 anos que não vejo o Dadinho, não falamos por telefone nem trocamos e-mails. Na verdade, nem sabia que ele tinha filha.

Isso é triste, apartar-se assim dos amigos. E talvez seja algo ainda mais grave: você não se aparta de alguns amigos, você encerra vidas que teve.

Lembrei do histórico Verão de 98. Tínhamos uma turma grande e saíamos juntos todas as noites e era muito divertido. Mas a Mariana Bertolucci, em certo momento, nos negligenciou, e eu disse para ela:

- Mais tarde, vamos nos separar para sempre, e tu vais sentir saudade.

Ela: - Ai, David! "Para sempre"?

Não era drama. Vivemos muitas vidas em uma e, assim, morremos muitas vezes também. São mundos que se acabam. Aquele mundo do Verão de 98 não existe mais. Nem a cidade é a mesma.

É por isso que, quando você reencontra um velho amigo, é como se reencontrasse também um outro que você foi.

Como eu era, quando convivia mais com o Dadinho? Nós fazíamos festa em Cachoeira, escutávamos o Supertramp e, bem, éramos mais magros. Ou pelo menos eu era, não sei se o Dadinho engordou.

O que eu diria para aquele que fui se o encontrasse? Algo sobre os perigos do consumo excessivo de embutidos? Para usar filtro solar, como o Bial? Para estudar mais inglês?

Não... Diria para não perder tempo com pessoas negativas. Para entender que, às vezes, pessoas muito críticas não são inteligentes; são amargas. Para saber que aquele que sempre vê o mal nos outros está vendo dentro de si mesmo. Porque o mal é o que sai da boca do homem.

É isso. Diria para mim que ignorasse essas pessoas sombrias e desse atenção a tantas outras luminosas. Aos seres humanos de bom coração, como o Dadinho. Aos amigos do peito. Esses para quem você olha e são como se fossem um espelho. Você vê quem foi e, mais do que isso, vê quem poderá ser. Porque, no mundo do futuro, seu amigo estará lá. Junto com você.

DAVID COIMBRA

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